sábado, 3 de outubro de 2009

Duas Histórias da Turma do Pererê

* Ledora: Anair Campos

Nota sobre A Turma do Pererê:

Ziraldo (Alves Pinto) escreveu e desenhou as historinhas da Turma do Pererê, com a colaboração de Paulo Abreu (Arte-final), Heucy Miranda (Cores) e João Barbosa (Letras). O Pererê foi publicado primeiramente em cartuns (1959) nas páginas da revista "O Cruzeiro". Ziraldo criou seus personagens em 1958.
A turma do Pererê foi a primeira revista brasileira em quadrinhos que era totalmente colorida. Lançada em outubro de 1960, sendo publicada em 43 edições mensais, até abril de 1964. Além do sucesso nacional, foi a de maior duração entre os quadrinhos da época, com uma tiragem mensal de 120.000 exemplares e foi a primeira "HQ" a "dar certo" entre os quadrinhos brasileiros.

Era protagonizada por um menino negro, de uma perna só, que vivia suas aventuras na companhia dos amigos, Tininim (um menino índio); Galileu Bonifácio (uma onça macho); Alan (um macaco); Pedro Vieira (um tatu); Moacir (um jabuti); Geraldinho (um coelho) e General Nogueira (uma coruja macho), conselheiro da turma e às vezes chamado de Professor Nogueira. Havia também duas meninas: Boneca de piche, namorada do Saci
e Tuiuiu (uma índia), namorada do Tininim.
Elas eram o motivo das rusgas entre Pererê e Tininim com Rufino e Flecha Firme. Estes dois fazem parte da turma do Rufino (um menino da cidade) e que era uma espécie de cópia carbono da turma do Pererê, com suas cores mais escuras do que as da turma do Saci. Além do Rufino e do Flecha Firme (um menino índio de pele azulada), havia o jabuti Queiroz, o tatu Gláucio, o coelho Geraldão, a coruja macho Marechal, a onça macho Virgilão e o macaco Leopoldo.
Tinha o Compadre Tonico Macedo e Seu Neném Moreira, dois caçadores que inventavam mil armadilhas para capturar o Galileu, mas que nunca davam certo... pra sorte da onça!

Outros personagens apareciam de vez em quando nas historinhas: Mamãe Docelina (uma simpática senhora); Seu Nereu da Silva Pinto (pai da Boneca de Piche) e Nozito (um menino pobre), filho de Dona Eborina.

As aventuras se passavam na Mata do Fundão, um lugar indeterminado no interior do Brasil. Ali havia a Fazenda das Canoas, a Fazenda do Dodói, a Fazenda Inglaterra, a Estrada Velha, a Estrada das Pedras, o Ribeirão da Nódoa (córrego que separa a fazenda Inglaterra da Mata do Fundão), a Serra Matrona (onde está o quartel-general da turma do Pererê na luta contra a turma do Rufino) e o Coqueiral do Salim. Próximo à Mata do
Fundão, encontramos a Mata do Pula-Onça, onde nasceu Galileu.

As crianças da historinha têm entre dez e doze anos. Saci é o líder: esperto, sensível, alegre, questionador e poético. Fuma cachimbo, anda nu e de vez em quando está montado em seu redemoinho de vento, com seu gorro vermelho. Tininin é um índio da tribo dos Parakatokas, cuja aldeia fica lá no fundo da Mata do Fundão. Amigo fiel do Pererê, está sempre inventando uma doença ou um perigo imaginário que ele tem que
vencer... e acaba vencendo.
Boneca de Piche "da jabuticaba" simboliza a menina do "interior" que gosta de ouvir seresta ao violão, de poesia, de ganhar presentes e de festas. É carinhosa e sensível.
Tuiuiu, a indiazinha, melhor amiga da Boneca, é quem organiza as festas na Mata do Fundão.

A Turma do Pererê também foi filmada, a partir de dezembro de 1998 pela TVE, na cidade mineira de Tiradentes, tendo 20 episódios que foram transmitidos nas manhãs de sábado pela emissora. André Alves Pinto e Sônia Gancia eram os diretores da série.
A Turma do Pererê marcou uma fase dos quadrinhos brasileiros e vive, ainda hoje, na memória de muita gente grande.

Luís Campos

- - -

A Turma do Pererê, em... A Carta!


Q1. Vê-se Moacir, o jabuti carteiro, sobre uma grande pedra e outros da turma do Pererê, embaixo (Pererê, Tininim, o macaco Alan, o coelho Geraldinho, o tatu Pedro Vieira e a onça galileu.

N: Moacir está com uma carta na mão...

Todos gritam - Pra mim! Pra mim!

Moacir - Mas quero que todos ouçam... a "União dos Carteiros da Selva" vai me dar um prêmio e um diploma, quando eu completar mil mensagens entregues!

Pererê - Grande, Moacir! E quantas você já entregou até hoje?

Moacir - Com esta... novecentas e noventa e nove, sem perder uma! Na próxima chego lá!

Q2. Vê-se Queiroz, o jabuti carteiro da turma do Rufino, escondido atrás duma moita.

Queiroz - Não, se eu puder impedir... rê rê rê!

Q3. Queiroz chega na beira do rio, onde está Rufino e sua turma: a onça Virgilão, o tatu Gláucio, o coelho Geraldão, o macaco Leopoldo e o índio Flecha Firme.

N: A turma do Rufino está pescando e chega Queiroz, correndo...

Queiroz - Turma, turma! Preciso da ajuda de todos vocês!

Flecha Firme - Não tá vendo que nós estamos pescando, Queiroz?
E além do mais, você tá suspenso da turma!

Gláucio - Vê se desguia!

Virgilão - Pé-frio!

Queiroz - M-mas é que... o Moacir tá pra ganhar um prêmio e um diploma como o melhor carteiro da mata!

Flecha Firme - E daí?

Queiroz - Daí, que aquele cara já é enjoado como está... já pensou como vai ficar?

Flecha Firme - Um enjoado com diploma!

Virgilão - Mas não foi justamente por causa de uma mensagem que o Queiroz foi suspenso?

Rufino - Foi! Ele perdeu uma carta que minha mãe me mandou do Rio com um cheque dentro!

Queiroz - Mas vocês nem me deram chance de contar como aconteceu! A carta foi roubada!

Geraldão - Você parou pra dormir com a carta na mão... e acordou sem
ela, isso sim!

Queiroz - Certo, Geraldão, mas... eu senti quando me arrancaram a carta das mãos, mesmo cochilando!

Rufino - Isso muda tudo! Fomos injustos com o Queiroz, Virgilão!

Virgilão - Sim! Que ele volte pra turma!

Queiroz - Então vocês vão me ajudar?

Flecha Firme - A fazer o quê?

Queiroz - A impedir que o Moacir ganhe o tal diploma, uai!

Gláucio - Sim, mas... como?

Queiroz - Basta fazer com que ele não consiga entregar a tal milésima mensagem!

Flecha Firme - Rê rê rê!

Rufino - Conte conosco! Será um prazer atrapalhar qualquer um da turma do Saci!

Q4. Vê-se Queiroz sozinho.

Queiroz (Pensando) - Eu não disse que quem me arrancou a carta das mãos foi o vento... mas, que mal há empregar uma mentirinha?
Agora é só ficar de olho no Moacir e atrapalhar o danado quando ele gritar... caaaaarta!

Q5. Vê-se Moacir com sua sacola de estafeta (carteiro).

Moacir (Gritando) - Mensagem! Mensagem!

Q6. Vê-se a turma do Rufino atrás de uns arbustos.

Queiroz - Cambada... depressa! O Moacir vai entregar a milésima !

Flecha Firme - É pra já!

Q7. Vê-se a turma do Rufino correndo.

N: Todos saem correndo atrás do Moacir...

Rufino - Vamos turma! Vamos deter o Moacir senão ele vai pensar que é o Pelé!

Virgilão - Deixa comigo!

Q8. Vê-se o Moacir correndo pela mata.

Moacir (Gritando) - Mensagem! Mensagem!

Q9. Vê-se Virgilão e Queiroz.

Virgilão - Olha lá, olha lá... o Moacir vem que vem zunindo pelo
meio da mata!

Queiroz - Este cipó vem a calhar!
Eu vou pro outro lado da picada!

Q9. Moacir está caído no chão.

N: Moacir tropeça no cipó...

* POF!

Moacir (Caindo) - Iau!

Q10. Vê-se Queiroz atrás duma árvore.

Queiroz (Pensando) - Barulhinho gostoso de se ouvir, sô!

Q11. Vê-se Moacir correndo.

N: Moacir levantou-se e continuou a correr, gritando...

Moacir - Mensagem! Mensagem!

Q12. Vê-se a turma do Rufino.

N: A turma do mal ficou a ver navios...

Rufino - Hã?! Ele continuou!

Queiroz - Ele levantou, sacudiu a poeira e deu a volta por cima!

Flecha Firme - O jeito é cercar ele lá na ponte de corda!

Virgilão - Eu conheço um atalho!

Leopoldo - Vamos lá!

Gláucio - O Moacir pode ser eficiente, mas rápido ele não é!

Queiroz - Vamos desamarrar as cordas da ponte e esperar!

Q13. Vê-se a turma do Rufino desamarrando a ponte.

Queiroz - Pronto! Tudo desamarradinho! Quando o Moacir passar por aqui... tchibum!

Q14. Vê-se o Moacir correndo.

Moacir (Gritando) - Mensagem! Mensagem!

Q15. Vê-se a turma do Rufino atrás dumas árvores.

Queiroz - Ouçam! É a voz dele!

Rufino - Sim, mas... tá do outro lado do rio!
Ele já tinha passado!

Leopoldo - Ah, não!

Rufino - E agora está zanzando por lá, à procura da turma!
Só tem um jeito! Tomar a mensagem na marra!

Virgilão - Atacar!

Q16. A turma do Rufino está sobre a ponte.

Q17. Todos caem no rio.

* TCHIBUM!

Q18. Moacir vê a turma do Rufino dentro do rio.

Moacir - Ei, gente boa... essa eu não entendi! Passei inda agorinha pela ponte e...

Virgilão - Cala a boca!

Q19. Rufino toma a carta da mão do Moacir.

Rufino - E passe pra cá essa tal mensagem!

Moacir - M-mas...

Rufino - Quer ver o que a gente faz com ela?
Mostre pra ele, Queiroz!

Moacir - M-mas...

Flecha Firme - Rê rê rê!

Queiroz (Rasgando a carta) - Adeus mensagem número mil!

* RASG!

Rufino - Rá rá rá!

Moacir - Acontece que eu entreguei a milésima mensagem! Iupi! Iááá! toda a turma do mal - Como?!

Moacir - Eu achei essa carta perdida no meio dumas moitas e vim
entregar... e era endereçada a você, Rufino!

Queiroz - O quê?

Moacir - E era uma carta da mãe dele... eu conheço carta de mãe! E além disso, estava escrita no verso... remetente: Dona Rufina!

Q20. Vê-se a turma do Rufino correndo atrás do Queiroz.

Queiroz (Correndo) - Socorro! Socorro!


FIM

- - -

A Turma do Pererê, em... As Anedotas do Saci!


Q1. Vê-se o Saci Pererê, Tininim, Geraldinho, Moacir, Alan e Pedro Vieira, sentados sobre uma grande pedra.

N: Todos estão rindo...

Todos - Hahahahahahahaha! Hahahahahahaha!

Tininim - Conta, conta, Saci! Conta outra!

Moacir - Essa foi boa demais!

Q2. Galileu chega onde eles estão.

Galileu - Espera, espera... eu também quero ouvir!

Pererê - Seguinte...

Q3. Vê-se toda a turma reunida sobre a pedra.

Galileu - Conta, conta, conta!

Pererê - Vocês conhecem a do inglês que tinha um cachorro que era campeão de luta? Vou contar!

N: Todos ficam atentos à história...

Pererê - Os dois, o cachorro campeão e o inglês, percorriam o mundo ganhando apostas. Um dia, chegaram a uma cidadezinha no interior do Brasil e custou pra aparecer um capiau que topasse trazer seu cachorro para brigar com o do inglês. Juntou todo mundo na pracinha e botaram os dois cachorros no meio. O cachorro do inglês tomou posição feito um campeão e o cachorrão do capiau foi chegando, foi chegando e... pá!
Deu uma patada nele que voou cachorro de inglês pra todo lado!
"De onde veio esse cachorro?", perguntou o inglês assustado.
E o capiau respondeu... "Óia, moço, sei não! Um dia resolveram acabar com o circo que tava aqui, o dono não tinha o que fazer com esse bicho, deu ele pra mim. Eu cortei a juba dele e botei lá no quintá!"

N: Todos riram... menos Galileu.

Galileu - Onde é que está a graça, que o papai aqui não morou?

Geraldino - Pelo amor de Deus, Galileu... tá na cara!
Uma anedota fácil desta!

Galileu - Explica, vá! Explica que eu tô doido pra rir!

Pererê - Galileu! Presta atenção nos detalhes!
O capiau cortou a juba do bicho... juba, entendeu? Quer dizer, não era cachorro, entendeu?

Galileu - Ah... é mesmo! Claro! Não era cachorro, claro!
Mas... pera lá! Se não era cachorro, que bicho que era, então?

Pedro Vieira (Gritando) - Leão Galileu! Leão!
Um baita leão! Você não ouviu?

Alan - Juba... juba! O único bicho que tem juba, Galileu, é leão!

Galileu (Pensando) - É mesmo... diabo de menino inteligente, sô!
(Falando) - Agora entendi... todo mundo pensando que era um cachorro velho e era um leão, todo grandão, que veio vindo, veio vindo, todo lerdo... e pá! Deu o maior pau no cachorro do inglês!

Tininim - Isso! Exato!

N: Todos estão olhando pra Galileu...

Galileu - E qual é a graça?
Se ainda fosse uma onça!

N: Todos continuam olhando pra Galileu, sem entenderem nada. Galileu dá um pequeno empurrão no Pererê que o cachimbo deste cai ao chão...

Galileu - Vá, Saci, conta outra! Conta outra que eu prometo que dessa eu vou rir!

Geraldinho - É incrível a paciência do Saci!

Moacir - O contador de anedotas tem que ser um ator!

Galileu (Pensando) - Ninguém pode dizer que eu não estou prestando atenção!

Pererê - Muito bem... deixa eu ver se me lembro de outra...
Ah, sim... vou contar a do domador! Vocês conhecem a do domador?
Era uma vez um camarada que estava desempregado e não sabia o que ia fazer da vida. Aí, um amigo dele falou pra ele assim... "por que é que você não entra para um circo pra ser domador?"
O outro achou a idéia ótima e foi pra casa treinar e acabou arranjando um emprego de domador num circo... foi ser domador de pulga!

Galileu - Rá rá rá rá rá rá!
Domador de pulga... rá rá rá rá... adorei!
É a piada mais engraçada que já ouvi em minha vida!

Pererê - Galileu, a anedota ainda não acabou!

Galileu - Não? Arrá! Mas você já percebeu que dessa eu vou rir, não é?
Você já sentiu, não é? Vá... conta o resto!

Pererê (Pensando) - Deixa eu ver onde eu parei! Ah, sim...
Aí, uns trinta anos se passaram. Um dia, o camarada que deu o conselho passou em frente de um circo e viu lá que o circo tinha um domador e resolveu entrar pra ver. Era o amigo dele que estava lá... só que agora ele estava domando elefantes. Aí, o amigo falou... "Ué, rapaz, você não era domador de pulga?"
E o domador respondeu... "Era, sim, rapaz! Mas, você sabe, o tempo foi passando, eu fui ficando velho, a vista foi ficando fraca..."

N: Todos gargalharam... menos Galileu...

Todos - Hahahahahahahahaha! Hahahahahahahahaha!

Galileu - Acabou?!

Pererê (Zangado) - Vai dizer que essa também você não entendeu, Galileu?

Galileu - Claro que entendi, Saci! Claro, pô!
Mas acho que sou obrigado a fazer uma pequena observação... em particular!

Q2. Vê-se a turma indo embora.

Tininim - Tchau, Saci! A gente vai se mandar!

Geraldinho - Amanhã a gente vai se reunir de novo pra você contar outras!

Alan - Eu vou pra casa treinar! Também tenho umas boas pra contar!

Q4. Vê-se Galileu e Saci.

Pererê - Diga aí, Galileu!

Galileu - Se você quer, realmente, ser um bom contador de anedotas, Saci, tem que cuidar mais do seu repertório... por exemplo... essa última anedota que você contou aí. O final dela até que não é mau!
Não... não é... mas, você me desculpe!
Sou obrigado a lhe confessar... eu gostei mais do meio!


FIM

- - -

Um comentário:

  1. Algumas observações e comentários; tudo bem?

    1) O Ziraldo já fazia cartuns com o Pererê sozinho; daí quando pediram a ele para criar uma revista com o Saci como protagonista, vieram outras personagens.

    2) Vocês podem citar também o fato de ter sido a 1ª. revista em quadrinhos brasileira a ser escrita por um único autor.

    3) A Mata do Fundão representa o próprio Brasil em si, talvez até por isto, nunca foi dita exatamente a localização.

    Podem crer?

    ResponderExcluir